IDAI foi, mas o trauma ficou
É manhã de sexta-feira (22 de Março), dia normal de aulas. Uma equipe de colaboradores da Save the Children International em Moçambique, na companhia do Chefe do Posto Administrativo de Cafumbe, desloca-se à localidade de Chongo, uma das afectadas pelo ciclone IDAI, para fazer levantamento dos danos. Uma das paragens foi a EPC de Maparanhanga Serra, que recebeu-nos com um silêncio atípico de uma escola em pleno dia de aulas. Não se via uma pessoa sequer que não fosse o professor Marques Zacarias que veio ao nosso encontro logo que se apercebera da nossa chegada. Ele prontamente explica os motivos por trás daquele cenário sombrio. “Retomamos as aulas no dia 18, mas ontem (21) circulou um boato sobre a ocorrência de mais um ciclone, por isso tivenos que suspender as aulas. As pessoas estão traumatizadas, e neste estado estão vulneráveis a qualquer boato ou desinformação”, lamentou o educador que também mostra-se ainda assustado, ao partilhar a sua história.
Era noite de quinta-feira (14 de Março), data que por sinal ficará marcada na vida de várias famílias da região centro do país. Marques estava a dormir na casa do Pronto Socorro instalado ao pé da escola, para controlar o material que fica lá guardado, incluindo livros escolares.
A escola, por não ter um aparelho radiofónico, não tinha tido informação sobre o ciclone, por isso as aulas na manhã daquele dia tinham decorrido normalmente. Já no período da tarde, quando o director da escola se deslocou à sua residência, tomou conhecimento, a partir da rádio, da ocorrência do fenómeno. De imediato ordenou que os alunos fossem dispensados mas, porque até as 12horas não havia qualquer indício, conforme lembra o professor, não se deu muita importancia à recomendação do director. As aulas obedeceram o seu horário normal: 12horas às 17:30horas, divididas em dois turnos.
Ao cair da noite, por volta das 21horas, Marques Zacarias, que no momento encontrava-se sozinho no Pronto Socorro, foi surpreendido por uma forte chuva e ventos. “Comecei a ver chapas de zinco a cairem uma a uma. Fui me refugiar num outro quarto, mas o cenário continuava e a água da chuva começava a invadir a casa. Fiquei desesperado, porque havia muitos livros do ano passado, que estavam a ser conservados para serem distribuídos aos novos ingressos. O arquivo da escola, livros de turma, alguns equipamentos de saúde também estavam lá. Tentei carregar para o quarto ao lado,mas também começou a inundar. Fiquei mais desesperado ainda porque não podia correr para as salas de aulas porque soprava e chovia muito. Tentei carregar novamente as coisas para um outro quarto que não estava completamente destruído, mas parte considerável do material ficou danificado”, lembra.
Já pela manhã, quando o vento mudou de direcção, Marques Zacarias tentou refugiar-se nas salas de aulas, e tentou igualmente, salvar o material. Parte da comunidade e os professores que leccionam nas salas anexas também correram para refugiar-se na escola. “Muitas casas não resistiram ao vendaval, embora estejamos numa zona montanhosa. As crianças perderam todo o material escolar, porque quando iniciou a tempestade, as pessoas preocuparam-se apenas em salvar as suas vidas, correndo para a escola.”
A escola, localizada na comunidade de Maparanhanga Serra, tem três escolas anexas – entre as quais uma teve tres salas completamente danificadas em consequência da queda de uma árvore sobre elas - e lecciona um total de 804 alunos. O Pronto Socorro (que também ficou destruído) tem atendido a casos de malária e febres por técnicos da saúde que têm feito rondas periódicas e têm trabalhado com um socorrista local, este que fica a atender a comunidade na ausência destes. Casos mais complicados são encaminhados ao Centro de Saúde de Bica, que dista á 11 quilómetros.