ASSEGURANDO A EDUCAÇÃO EM TEMPOS DE COVID-19: O CASO DO PROJECTO NORAD
O Projecto NORAD da Save the Children, em parceria com o Governo da Província de Manica, implementam desde Maio de 2020, a estratégia de ensino baseado nas famílias para evitar a desistência dos alunos nas escolas das regiões mais recônditas durante as restrições impostas pela pandemia da COVID-19 e que afectam a educação das crianças de forma particular. Neste âmbito foram treinados 436 professores ambulantes e 520 promotores comunitários de leitura para responder a cerca de 50,142 alunos nos distritos de Macossa, Tambara, Machaze e Manica.
Em Março de 2020 o Estado Moçambicano decretou o Estado de Emergência como medida para prevenir e conter uma rápida propagação da COVID-19. Dentre as restrições impostas, foram encerradas todas as escolas do país. E para que os alunos mantivessem o ritmo escolar, as matérias passariam a ser lecionadas em casa através de aulas nos canais públicos de televisão e da rádio televisivas e também a partir de fichas de exercícios que os pais e/ou encarregados de educação deveriam levantar nas escolas dos seus filhos e/ou educandos.
A realidade de alguns distritos recônditos da província Manica, porém, mostrou não só a escassez de material de reprodução de fichas de exercício para os alunos, como também que muitas famílias não possuem um aparelho de rádio ou televisão, para não mencionar o facto de muitas comunidades não estarem ligadas à rede de energia eléctrica. O distrito de Macossa, por exemplo, não tem rádio comunitária, o que torna praticamente impossível aos alunos continuar a estudar nos moldes propostos pelo Governo.
Como forma de minimizar a situação, o projecto NORAD da Save the Children, em parceria com o Governo, procurou uma alternativa que fosse abrangente para 50,242 alunos dos quatro distritos de implementação daquele projecto, nomeadamente Macossa, Sussundenga, Machaze e Macate. A solução foi estabelecer um sistema de professores ambulantes. Estes teriam a responsabilidade de produzir e reproduzir fichas de exercícios manuscritos ou digitalizados, onde fosse possível. Por outro lado, foi activado um grupo de 520 promotores comunitários com a responsabilidade de recolher as fichas de exercícios nas escolas e entregá-las aos alunos nas suas respectivas casas, ao mesmo tempo que explicar o seu conteúdo e esclarecer dúvidas.
A Directora de Programas da Save the Children em Manica, Ana Dulce Guizado, explica que o ensino é baseado nas famílias porque o promotor comunitário de leitura leva os exercícios até a casa do aluno e depois disso assegura que a criança faça exercício dentro do seu meio familiar e no dia seguinte ele recolhe os exercícios para a escola para que os professores possam corrigir.
“A sociedade deve salvaguardar os direitos da criança e a educação é fundamental, tanto que é um dos nossos pilares estratégicos de acção. Um dos grandes desafios que enfrentamos é assegurar que mais raparigas tenham acesso à educação - uma educação de qualidade. Para isso precisamos do apoio e do compromisso das famílias", disse a Ana Dulce Guizado.
MACOSSA E MACHAZE COMO DISTRITOS-MODELO
Macossa e Machaze são os distritos-modelo de implementação da estratégia de ensino baseado nas famílias, pois é através desta estratégia que o Serviço Distrital de Educação, Juventude e Tecnologia (SDEJT) de Macossa resgatou um pouco mais de 50 alunos que se encontravam nas machambas. O Chefe da Repartição de Educação Geral no SDEJT de Macossa, Manuel Fundisse, avalia de forma positiva a estratégia de ensino baseado nas famílias implementado pela Save the Children.
“Sabemos que ao nível do nosso distrito, não temos a situação de rádios comunitárias em que algumas crianças aprendem nos outros distritos. Reconhecendo essas dificuldades, recebemos de bom agrado esta estratégia de ensino baseado na família e está a surtir efeitos esperados", disse Manuel Fundisse.
Por sua vez, o director distrital de Educação, Juventude e Tecnologia de Machaze, Juvêncio Fulede, avalia o ensino baseado na família como uma mais valia para o sistema de educação no geral, e é da opinião que mesmo depois retoma normal das aulas, a estratégia deve continuar.
“Tivemos muitas dificuldades no inicio da implementação do decreto, mas logo que começamos o modelo baseado nas famílias notamos que as crianças que haviam passado para a 3ª classe já conseguiam ler palavras, frases simples e números. As crianças não saiem de casa, elas agora têm uma ocupação específica e controlada através do promotor leitura, o que é um grande ganho. Estamos a sentir que os pais e encarregados de educação estão muito engajados", afirmou Juvêncio Fulede, Director Distrital de SDEJT de Machaze.
O QUE DIZEM OS BENEFICIÁRIOS?
Na comunidade de Nhamagua, no Distrito de Macossa, tivemos a oportunidade de conhecer a menina Serena João, de10 anos de idade. Ela frequenta a 4ª classe e afirma ter recebido os exercícios através dos promotores de leitura, de quem também tira dúvidas em algumas matérias.
“Estou a gostar dos exercícios; o professor pode continuar a trazer aqui em casa porque gosto de estudar. Quando eu crescer quero ser carpinteira para fazer portas aqui na minha vila", disse.
Os pais e encarregados de educação no distrito de Macossa e Machaze congratulam a estratégia, pois ela possibilita e impulsiona o ensino e aprendizagem dos seus filhos. Edmo Sianhalo, pai da Serena João, afirma que a sua filha está a cada vez mais a evoluir na escola.
“Antes da introdução deste sistema, era difícil concentrar as crianças para estudarem; tudo o que queriam era ficar nas ruas a brincar. Quando os promotores começaram a actuar e a trazer exercícios, sentimo-nos aliviados porque já era sem tempo. Tenho estado a acompanhar o desempenho dela e a ajudar o trabalho dos promotores dentro das minhas capacidades”, disse Edmo Sianhalo.
Dunda, no distrito de Macossa, é uma outra comunidade onde o Projecto NORAD está a implementar o sistema de ensino baseado nas famílias. Aqui são assistidos mais de mil alunos das Escola Primárias de EP1 EP2 de Dunda, tarefa exercida por três professores ambulantes.
Joaquim Serrote frequenta a 6ª classe e afirma:
“Costumo receber exercício para resolver no caderno e às vezes leio livro para ajudar a resolver esses exercícios que professor Inácio Raisse traz semanalmente".
Elisa Marizane é avó de Joaquim Serrote, acompanha de perto o empenho do seu neto e diz que “a iniciativa é boa porque incentiva o ensino, algo que o meu filho (o pai do Joaquim) não teve a possibilidade de usufruir devidamente. A escola está a andar bem para os meus netos e é bom porque enquanto estiverem aqui em casa estão igualmente prevenidos contra a coronavírus. Quero que eles sejam doutores".
Em Machaze, o menino Zacarias Timóteo, de nove anos e estuda na Escola Primária do 1° e 2° Grau de Save, na 3ª classe, e diz que “anima” estudar em casa, apesar de sentir falta das brincadeiras da escola. Gosta de ler e tem o sonho de ser professor quando crescer.
“Eu gosto de estudar na escola também para brincar com meus amigos, mas aqui em casa quando a minha promotora chega, eu gosto de estudar com ela e quero ser professor quando crescer ", disse Zacarias
Ainda em Machaze na comunidade de Macu, conhecemos o pequeno Moisés Mussá, de nove anos e que estuda na escola local. Ele afirma sentir falta do seu amigo e colega Elias, que não o vê desde o encerramento das aulas.
“Queria voltar para escola para ver meu amigo Elias. Quando voltar à escola quero muito estudar para ser professor, porque os professores recebem dinheiro e com esse dinheiro vou poder ajudar os meus pais, disse Moisés.