ASSEGURANDO A EDUCAÇÃO EM TEMPOS DE COVID-19: O CASO DO PROJECTO NORAD

Thursday 22 October 2020

O Projecto NORAD da Save the Children, em parceria com o Governo da Província de Manica, implementam desde Maio de 2020, a estratégia de ensino baseado nas famílias para evitar a desistência dos alunos nas escolas das regiões mais recônditas durante as restrições impostas pela pandemia da COVID-19 e que afectam a educação das crianças de forma particular. Neste âmbito foram treinados 436 professores ambulantes e 520 promotores comunitários de leitura para responder a cerca de 50,142 alunos nos distritos de Macossa, Tambara, Machaze e Manica.

Em Março de 2020 o Estado Moçambicano decretou o Estado de Emergência como medida para prevenir e conter uma rápida propagação da COVID-19. Dentre as restrições impostas, foram encerradas todas as escolas do país. E para que os alunos mantivessem o ritmo escolar, as matérias passariam a ser lecionadas em casa através de aulas nos canais públicos de televisão e da rádio televisivas e também a partir de fichas de exercícios que os pais e/ou encarregados de educação deveriam levantar nas escolas dos seus filhos e/ou educandos.

A realidade de alguns distritos recônditos da província Manica, porém, mostrou não só a escassez de material de reprodução de fichas de exercício para os alunos, como também que muitas famílias não possuem um aparelho de rádio ou televisão, para não mencionar o facto de muitas comunidades não estarem ligadas à rede de energia eléctrica.  O distrito de Macossa, por exemplo, não tem rádio comunitária, o que torna praticamente impossível aos alunos continuar a estudar nos moldes propostos pelo Governo.

Como forma de minimizar a situação, o projecto NORAD da Save the Children, em parceria com o Governo, procurou uma alternativa que fosse abrangente para 50,242 alunos dos quatro distritos de implementação daquele projecto, nomeadamente Macossa, Sussundenga, Machaze e Macate.  A solução foi estabelecer um sistema de professores ambulantes. Estes teriam a responsabilidade de produzir e reproduzir fichas de exercícios manuscritos ou digitalizados, onde fosse possível. Por outro lado, foi activado um grupo de 520 promotores comunitários com a responsabilidade de recolher as fichas de exercícios nas escolas e entregá-las aos alunos nas suas respectivas casas, ao mesmo tempo que explicar o seu conteúdo e esclarecer dúvidas.

A Directora de Programas da Save the Children em Manica, Ana Dulce Guizado, explica que o ensino é baseado nas famílias porque o promotor comunitário de leitura leva os exercícios até a casa do aluno e depois disso assegura que a criança faça exercício dentro do seu meio familiar e no dia seguinte ele recolhe os exercícios para a escola para que os professores possam corrigir.

 “A sociedade deve salvaguardar os direitos da criança e a educação é fundamental, tanto que é um dos nossos pilares estratégicos de acção. Um dos grandes desafios que enfrentamos é assegurar que mais raparigas tenham acesso à educação - uma educação de qualidade. Para isso precisamos do apoio e do compromisso das famílias", disse a Ana Dulce Guizado.

 MACOSSA E MACHAZE COMO DISTRITOS-MODELO

Macossa e Machaze são os distritos-modelo de implementação da estratégia de ensino baseado nas famílias, pois é através desta estratégia que o Serviço Distrital de Educação, Juventude e Tecnologia (SDEJT) de Macossa resgatou um pouco mais de 50 alunos que se encontravam nas machambas. O Chefe da Repartição de Educação Geral no SDEJT de Macossa, Manuel Fundisse, avalia de forma positiva a estratégia de ensino baseado nas famílias implementado pela Save the Children.

 “Sabemos que ao nível do nosso distrito, não temos a situação de rádios comunitárias em que algumas crianças aprendem nos outros distritos. Reconhecendo essas dificuldades, recebemos de bom agrado esta estratégia de ensino baseado na família e está a surtir efeitos esperados", disse Manuel Fundisse.

Chefe da Repartição de Ensino Geral no SDEJT- Macossa, Manuel Fundisse

Por sua vez, o director distrital de Educação, Juventude e Tecnologia de Machaze, Juvêncio Fulede, avalia o ensino baseado na família como uma mais valia para o sistema de educação no geral, e é da opinião que mesmo depois retoma normal das aulas, a estratégia deve continuar.

 “Tivemos muitas dificuldades no inicio da implementação do decreto, mas logo que começamos o modelo baseado nas famílias notamos que as crianças que haviam passado para a 3ª classe já conseguiam ler palavras, frases simples e números. As crianças não saiem de casa, elas agora têm uma ocupação específica e controlada através do promotor leitura, o que é um grande ganho. Estamos a sentir que os pais e encarregados de educação estão muito engajados", afirmou Juvêncio Fulede, Director Distrital de SDEJT de Machaze.Director do SDEJT- Machaze, Juvêncio Fulede

 O QUE DIZEM OS BENEFICIÁRIOS?

Na comunidade de Nhamagua, no Distrito de Macossa, tivemos a oportunidade de conhecer a menina Serena João, de10 anos de idade. Ela frequenta a 4ª classe e afirma ter recebido os exercícios através dos promotores de leitura, de quem também tira dúvidas em algumas matérias.

 “Estou a gostar dos exercícios; o professor pode continuar a trazer aqui em casa porque gosto de estudar. Quando eu crescer quero ser carpinteira para fazer portas aqui na minha vila", disse.

Serena João, aluna da 3ª classe, junto do seu promotor de leitura , Henriques Gopane, em Nhamagua. Serena João, ladeada pelo seu irmão mais novo e pelos pais.

Os pais e encarregados de educação no distrito de Macossa e Machaze congratulam a estratégia, pois ela possibilita e impulsiona o ensino e aprendizagem dos seus filhos. Edmo Sianhalo, pai da Serena João, afirma que a sua filha está a cada vez mais a evoluir na escola.

 “Antes da introdução deste sistema, era difícil concentrar as crianças para estudarem; tudo o que queriam era ficar nas ruas a brincar. Quando os promotores começaram a actuar e a trazer exercícios, sentimo-nos aliviados porque já era sem tempo. Tenho estado a acompanhar o desempenho dela e a ajudar o trabalho dos promotores dentro das minhas capacidades”, disse Edmo Sianhalo.

 Dunda, no distrito de Macossa, é uma outra comunidade onde o Projecto NORAD está a implementar o sistema de ensino baseado nas famílias. Aqui são assistidos mais de mil alunos das Escola Primárias de EP1 EP2 de Dunda, tarefa exercida por três professores ambulantes.

 Joaquim Serrote frequenta a 6ª classe e afirma:

“Costumo receber exercício para resolver no caderno e às vezes leio livro para ajudar a resolver esses exercícios que professor Inácio Raisse traz semanalmente".

Joaquim Serrote, aluno da 6ª classe na EP de Dunda, em Macossa

 Elisa Marizane é avó de Joaquim Serrote, acompanha de perto o empenho do seu neto e diz que “a iniciativa é boa porque incentiva o ensino, algo que o meu filho (o pai do Joaquim) não teve a possibilidade de usufruir devidamente. A escola está a andar bem para os meus netos e é bom porque enquanto estiverem aqui em casa estão igualmente prevenidos contra a coronavírus. Quero que eles sejam doutores".

 Em Machaze, o menino Zacarias Timóteo, de nove anos e estuda na Escola Primária do 1° e 2° Grau de Save, na 3ª classe, e diz que “anima” estudar em casa, apesar de sentir falta das brincadeiras da escola. Gosta de ler e tem o sonho de ser professor quando crescer.

“Eu gosto de estudar na escola também para brincar com meus amigos, mas aqui em casa quando a minha promotora chega, eu gosto de estudar com ela e quero ser professor quando crescer ", disse Zacarias 

 Ainda em Machaze na comunidade de Macu, conhecemos o pequeno Moisés Mussá, de nove anos e que estuda na escola local. Ele afirma sentir falta do seu amigo e colega Elias, que não o vê desde o encerramento das aulas.

 “Queria voltar para escola para ver meu amigo Elias. Quando voltar à escola quero muito estudar para ser professor, porque os professores recebem dinheiro e com esse dinheiro vou poder ajudar os meus pais, disse Moisés.

A Coordenadora Provincial de Comunicação e Advocacia da Save the Children em Manica, Flávia Gumende, em conversa com Elisa Marizane, avó de Joaquim Serrote.